quarta-feira, 22 de junho de 2011

Gramsci e a pós-modernidade


O intelectual orgânico se digitalizou. Agora o seu lugar de atuação é o ciberespaço. A tradicional guerra de movimento travada nas trincheiras da sociedade civil gradativamente recria a organicidade de seus canais de atuação. Trata-se hoje da organicidade digital, esmerilhada nas pavimentações flutuantes das redes internáuticas. Os clamores e potencialidades da sociedade civil são reorganizados de acordo com a velocidade imposta pelas navegações computadorizadas. Então, o clássico papel informacional do intelectual orgânico gramsciano, qual seja, o de orientar e potencializar as demandas civis diante da máquina estatal – a sociedade política –, é hoje desempenhado pelo intelectual cibernético, que capta nas redes as vozes transnacionalizadas da sociedade civil. Portanto, a revolução não perpassa apenas pelas formas de organização civil, mas pela própria redefinição do espaço da política e porosidade das fronteiras nacionais. 

A soberania política dos países permanece uma realidade jurídica hegemônica, mas a mobilidade das interações sociais já superou as limitações geográficas, e é, de fato, uma realidade transnacional. A primavera árabe e a "facerevolution" são marcos práticos dessa suposição teórica: o mundo se uniu em solidariedade aos povos oprimidos do norte da África e do Oriente Médio. O embate dramático entre governos corruptos, repressores e ditatoriais e populações sedentas de direitos básicos equipadas com avançadas tecnologias da informação - internet, celulares e câmeras - se transnacionalizou. E as redes de solidariedade lederadas pelos intelectuais cibernéticos potencializaram os clamores revolucionários, os quais foram imprescindíveis para que o governo de  Mubarak fosse destituído do poder no Egito, o presidente da Tunísia, Ben Ali se refugiasse na Arábia Sáudita, e também para que ocorressem mudanças de governo - essas negociadas - na Síria, Jordânia, Iemen e Omã.  Os protestos também se espraiaram para o Sudão, Argélia, Bahrein, Irã, Iraque, e Marrocos. O caso da Líbia, com a resistência militar do governo Kadafi, se agravou para uma situação de guerra civil e, inclusive, uma intervenção internacional liderada pela OTAN. Ainda é muito cedo para entender a dimensão dos acontecimentos da primavera árabe, embora já possamos destacar o ineditismo desse tipo de revolução por efeito dominó articulada pela via digital.

3 comentários:

  1. Me vejo obrigado a dizer que, com o artigo inaugural deste espaco, caiu por terra a teoria de Psaturnino que o mesmo servira apenas como instrumento de simples utilidade pessoal.
    O tema abordado com toque de genialidade pelo autor, me trouxe, confesso, um sentimento um tanto quanto instavelmomentaneo. Isso se deu pelo fato de inicialmente ter saboreado doce gosto de ter certeza de que o movimento de extrema liberdade provocado pela onda digital pode ter consequencias de verdadeiro valor benefico produtivo. Todavia, a analise transitoria me levou a conclusao de um pensamento que outrora me causou perplexidade, qual seja, me parece que o "INTELECTUAL CIBERNETICO TUPINIQUIM" esta de ferias, ou trabalha de acordo com o "horario oficial de Brasilia"(se e que me fiz entender)!
    O pais que enche os pulmoes para gritar que e modelo de liberdade social, na minha modestia opiniao, e igual, ou mais prisioneiro dos regimes impostos do que os que, como no mundo arabe, lutam por mudancas, com uma diferenca: somos cumplices, e co-participes do que ousaria chamar de colonizacao pos-moderna.
    Longe de querer parecer falso moralista, penso que quando o jovem de classe media brasileiro, aquele que tem acesso a um infinito mundo de fontes de informacao e deveria ser protagonista da propagacao do conhecimento, usa das redes, em seus dominios publicos para dizer que, "vou ao banheiro e ja volto"; "MC Fulano! Bom Demais!!", esta de certa forma matando na origem a semente do que poderia vir a ser tornar a verdadeira manifestacao do sonhado intelectual cibernetico tupiniquim. Isto se faz evidente quando, por exemplo, correntes virtuais com o escopo de boicotar determinadas franquias de postos de combustiveis buscando fragilizar o cartel assassino que predomina neste segmento passam em branco, enquanto outras assustadoramente banais levam milharem de jovens brasileiros como seguidores.
    Usemos entao o exemplo da juventude arabe, usemos a liberdade de troca de informacao inimaginavel em nossa historia, para sim, compartilharmos nossas futilidades e imbecilidades, mas deixemos um espaco para SEM ORDEM, a consciencia de vir aqui e discutir FUTEBOL, POLITICA e RELIGIAO.
    No pais em que o gado e criado solto, e numa demonstracao de inteira subordinacao volta ao abate no final do dia, fica dificil pensar em algo diferente do que Gramsci enxergou atraves da hegemonia cultural. Povo marcado!! Povo FELIZ!!

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  2. Aproveitando a deixa!!
    https://secure.avaaz.org/po/save_our_forests/?r=act

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  3. Leonardo Costa David,

    Muito obrigado pela contribuição de alto nível. "O intelectual cibernético tupiniquim está de férias" - Gramsci teria orgulho de sua leitura teórica. Da prática política jamais teria orgulho. Ficaria assombrado com sua ácida e justa crítica à apatia do jovem brasileiro, que opta por utilizar o espaço - que no mundo vem sendo legítimo espaço de organização da sociedade civil - para valorizar as futilidades do cotidiano. É pura carência, reflexo de um sistema político hegemônico cunhado pelas práticas nefastas do escravismo e do patriarcalismo. Causa-me calafrios concordar com cada palavra sua e perceber que faço parte de massa que assiste tudo bestializada - o que estamos fazendo com a nossa liberdade? trocando por um pouquinho de atenção? Essa é a marca do pensamento colonizado...é a marca de uma geração apolitizada, alheia aos procesos que lhe expurgam direitos básicos. A geração coca-cola sem gás. A metáfora do gado é perfeita, e o contratse com o intelectual demonstra o que somos e o que poderíamos ser. De fato, meu amigo, como massa bovina que somos na rede, a nossa única produção em rede é genuinamente escatológica. Agora deixa eu ir no facebook postar que vou dar uma cagada...

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